quinta-feira, 9 de junho de 2011

Palestra "Controle de capitais e proteção dos investidores estrangeiros no Brasil"

O evento foi bem maior do que eu esperava. Presidindo a mesa, o Pós-Dr. e renomado internacionalista Roberto Luiz Silva. Além de mim, também foi expositora a Juliana Porto, sobre a qual já falei neste Blog. Como debatedoras a Dras. Elida Graziane Pinto e Jamile Bergamaschine Mata Diz.
Os slides da minha apresentação seguem abaixo:





Apesar de ter gostado muito de comparar (e criticar) o Brasil de hoje com o Brasil imperial da época do Barão de Mauá, grão-mestre de nossa ordem econômica, o ponto mais atrativo do debate foi mesmo a discussão entre mim e a Juliana Porto a respeito das restrições sobre a compra de terras por estrangeiros.

Já falei sobre o tema no blog. Mas, contextualizando o assunto: A Advocacia Geral da União emitiu um parecer, vinculante aos órgãos da administração pública federal, que efetivamente restringe a compra de terras rurais de grande extensão por empresas brasileiras que tenham 51% ou mais de seu capital em posse de não residentes. Ou seja, empresas controladas por capital estrangeiro.

A Juliana interpretou o Parecer da União da seguinte forma: Segundo ela, o parecer da União diz que, apesar de a Constituição Federal ter eliminado a diferença entre empresas brasileiras de capital nacional ou de capital estrangeiro,  a AGU entende que a diferenciação contida da lei 5.709 ainda assim seria permitida

Eu interpreto o parecer da AGU de forma diferente, e menos otimista.

A meu ver, o parecer da AGU é uma peça ininteligível de sofismas, maus argumentos e contradições. Escrita por um jurista incrível e competente, sem dúvida, mas na qual transparece o sofrimento do redator em ter que dar forma jurídica e publicável a uma posição política ilegal, inconstitucional e, por fim, burra e absurda.

Quem tiver a paciência de refletir, hermeneuticamente, sobre o parecer, verá que o autor não foi temeroso o suficiente para dizer que a lei pode apresentar diferenciações que a constituição não permite. Na verdade, o que a AGU fez foi dizer: tudo bem, as empresas brasileiras de capital estrangeiro podem comprar terras no Brasil, mas, devem atender a uma série de requisitos burocráticos que as empresas brasileiras de capital nacional não precisam cumprir. Coisas simples, como obter APROVAÇÃO PRESIDENCIAL, VIA DECRETO.

A menos que os nossos políticos, no futuro, emendem a constituição de modo a tornar irremediável este tipo de Apartheid (ocasião em que eles podem também retirar o direito de voto dos brasileiros filhos ou netos de estrangeiros, já que o absurdo é da mesma natureza), o famigerado parecer nunca poderá ser interpretado como válido.

 Ele é discriminatório, pura e simplesmente. Viola a nossa constituição. Viola os tratados internacionais de que o Brasil faz parte. Viola os costumes de Direito Internacional, a teoria econômica, a lógica. No médio prazo, o próprio interesse do povo brasileiro.

Contudo, "dura lex, sed lex". E "Roma locuta, causa finita".  Temos que conviver com essa agressão, pelo menos até os tribunais revelarem à sociedade que essa situação não pode continuar.

Então, o que fazer nesse meio tempo? Afinal, os investidores estrangeiros não vão esperar para sempre e os bancos, fazendeiros, corretores, produtores de açúcar, cana, café e carne precisam atrair os investimentos para já. Para ontem. O BNDES não consegue suprir, sozinho, todo o crédito da economia brasileira.

 (A propósito. Vários clientes meus já disseram que o Brasil é ótimo, uma terra de ouro. Mas, se os procedimentos burocráticos forem muito complicados, eles simplesmente investirão no Uruguai, Argentina, Irã, Malásia, Moçambique ou qualquer outro país com terra boa e barata. Embora o interesse do cliente não fosse o de me magoar, posso dizer que ouvir isso tão abertamente foi um choque de realidade. Como a dizer: "a terra existe em muitos lugares. A tecnologia, o dinheiro e uma sociedade organizada capaz de produzi-los, quase em lugar nenhum. Não se infle de orgulho Brasil. Seu berço esplêndido não é mais lindo ou valioso que outros berços do mundo". Mas, eu devaneio. Voltemos ao assunto)

Seguem algumas estratégias jurídicas deliberadamente formuladas para contornar o parecer da AGU, permitindo que empresas brasileiras de capital estrangeiro possuam terras rurais de maneira ilimitada no Brasil.

Embora a apresentação dessas estratégias possa soar, a princípio, uma provocação à lei, gostaria de ressaltar que a mera existência de possibilidades jurídicas lícitas  de tornar o parecer inútil é um grande indício da sua total falta de fundamentos constitucionais e lógicos.

COMO EMPRESAS BRASILEIRAS DE CAPITAL ESTRANGEIRO PODEM POSSUIR OU CONTROLAR TERRAS RURAIS NO BRASIL


ATRAVÉS DE UM ACORDO DE ACIONISTAS

A empresa estrangeira pode, por meio de um bom acordo de acionistas, prever que, apesar de ter menos do que a maioria das cotas, seu direito a voto e seus direitos de distribuição de lucros serão, de fato, majoritários. Isso garantirá ao investidor estrangeiro o controle do investimento e o recebimento de lucros, sem violar a lei brasileira.

POR MEIO DE ARRENDAMENTOS RURAIS QUASE PERPÉTUOS

Desde que os arrendamentos sejam celebrados por meio de empresas com maioria de capital nacional, mas controladas de fato por estrangeiros, como acima.

POR MEIO DE DIREITOS DE SUPERFÍCIE, USUFRUTOS E PARCERIAS AGRÍCOLAS

Através do uso dos institutos acima, os estrangeiros podem ter, virtualmente, o controle pleno da terra por períodos de 20 até 100 anos. Muito embora não correspondam exatamente ao Direito de Propriedade, deve-se lembrar que grande parte dos investimentos estrangeiros em terras visam a ganhos no prazo de 10 a 30 anos e posterior revenda. Ou seja, para os estrangeiros, a solução acima é plenamente válida.

REGISTRAR E ENTRAR NA JUSTIÇA;

Uma vez que os Cartórios são vinculados aos governos Estaduais (via Tribunais de Justiça), éconcebível que a empresa brasileira venha a comprar a terra, depois alterar o contrato social , cedendo as cotas a estrangeiros. Se o governo federal questionar a operação, é possível acionar a justiça, alegando a inconstitucionalidade das proibições, através de inúmeras ações.  No mínimo, o investidor ganhará 5 anos de propriedade. Se a lei prevalecer, a ação será julgada procedente e o estrangeiro permanecerá na terra.

ABRINDO UM BANCO NO BRASIL, E FAZENDO TUDO ISSO JUNTO, EM BOLSA DE VALORES

Através de operações mais complexas, envolvendo financiamentos, fundos de investimento em bolsa e securitização de direitos reais, é possível organizar um mercado inteiro baseado na venda ou controle de terras a estrangeiros. Embora essa opção não seja a mais viável economicamente, ela demonstra o quanto a posição do governo é dúbia, vacilante e parcial. Ora, se bancos de capital estrangeiro podem através de operações financeiras,controlar fazendas, por que as empresas produtivas estrangeiras não poderiam fazer o mesmo?

MEIOS ILEGAIS NÃO SÃO NECESSÁRIOS.

O uso de "laranjas", a prestação de declarações falsas, a celebração de casamentos fajutos a fim de obter vistos permanentes, nada disso é necessário. Nestas práticas residiria a ilegalidade. E, com certeza, são estes os exemplos que grupos sociais mal informados e setores tradicionalistas do governo utilizarão para enganar o público. Não façam isso.

ATRAIAM O INVESTIMENTO. A AMAZÔNIA SEM USO NÃO VALE NADA.

Por outro lado, usem os meios legais acima. Atraiam o investimento. Como citei em minha palestra, no início do post, ideologias nacionalistas não enchem a barriga do povo. Investimentos reais na produção agrícola podem, pelo menos, ajudar.



4 comentários:

  1. Querido Adler,
    Achei incrível seu caloroso texto sobre a aquisição de terras por estrangeiros. Melhor ainda deve ter sido a discussão travada com a Dra. Juliana! Gostaria que vc me indicasse o parecer da AGU a que vc se refere.
    Forte abraço,
    Bethania Bosi

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  2. Cara Bethania,

    O parecer antigo éstá disponível em http://www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=8360&ID_SITE=

    O parecer novo (e ruim) está em http://www.agu.gov.br/SISTEMAS/SITE/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=258351&ID_SITE=

    Abraço,

    Adler

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  3. Prezado Adler
    Sou estrangeiro e quero comprar um terreno em zona urbana para construir uma casa.
    Qual são os documentos que preciso para fazer a compra do terreno e registrar o bem?
    Preciso de CPF? Como fazer o CPF como estrangeiro estando já no Brasil desde o dia 19 de dezembro do 2014 como turista?
    Preciso solicitar um RNE ou CIE?
    Muito obrigado,
    David

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    1. Caro David,

      Por favor me escreva em contato@adler.net.br.

      abraços ,

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